Atriz e diretora, Marcélia Cartaxo é uma artista que transcende as fronteiras que delimitam o real e o imaginário. Em 1975, na cidade de Cajazeiras, sertão paraibano, a então jovem menina, que surrupiava as moedas que os fieis depositavam na imagem de Santo Antônio para ir ao cinema, inicia suas atividades no Grupo de Teatro Terra, onde, anos mais tarde, seria descoberta pela cineasta Suzana Amaral. Em 1985, Marcélia tem sua estreia no cinema com o filme “A Hora da Estrela”, adaptação do romance homônimo de Clarice Lispector, dirigido por Suzana. Marcélia vive magistralmente a prosaica, encantadora e inesquecível Macabéa, o que lhe garante o Urso de Prata no Festival de Berlim.
Nas quatro décadas de trajetória como atriz no teatro, no cinema e na TV, Marcélia Cartaxo deu vida a dezenas de personagens, a maioria delas mulheres, que diante do calor escaldante do sertão ou do ar gélido e seco das multidões, solitárias das capitais do Sul e do Sudeste do Brasil, empunham a única arma que resta diante da invisibilidade social: a força da resistência. Sendo assim, Macabéa (A Hora da Estrela – 1985), Laurita (Madame Satã – 2002), Marcélia (O Céu de Suely – 2006), Nildes (Batismo de Sangue – 2007), Ceiça (Baixio das Bestas – 2007), Querência (A História da Eternidade – 2015), Maria (Big Jato – 2016), carregam a diversidade dos abismos morais e sociais deste País e representam, acima de tudo, a resiliente sobrevivência à opressão histórica à qual vivem subjugadas. Como realizadora, em seus dois curtas metragens, Tempo de Ira (2013), em co-direção com Gisella de Melo, e Redemunho (2015), Marcélia mantém seu olhar voltado para aqueles que estão à margem.
Diante da indiscutível importância de Marcélia Cartaxo para a história do Cinema Nacional, provavelmente Santo Antônio já a tenha anistiado, ou nas palavras otimistas da atriz: “o Santo pode até ter visto os pequenos furtos como um bom investimento”. Certamente, para o cinema brasileiro e seu público, não há dúvidas: foi um excelente investimento!